Intestino e a dor lombar

Relação do intestino com a dor lombar

6/24/20254 min read

A dor lombar é, sem dúvida, uma das queixas mais comuns da era moderna. Sedentarismo, más posturas, excesso de treino ou falta dele — tudo isso está, de facto, relacionado com as dores nas costas. Mas… e se eu te dissesse que o teu intestino pode estar a contribuir para a tua lombalgia? Pode parecer estranho, mas a ciência está a mostrar uma ligação surpreendente entre a saúde intestinal e a saúde da coluna.

Neste artigo, vamos explorar essa relação de forma simples, mas com base científica, para que possas cuidar da tua lombar de dentro para fora.

O segundo cérebro: o intestino

O intestino é muitas vezes chamado de “segundo cérebro” porque contém mais de 100 milhões de neurónios e comunica diretamente com o cérebro através do eixo intestino-cérebro. Mas essa comunicação vai além da saúde mental — ela tem implicações profundas nos processos inflamatórios, na perceção da dor e até no funcionamento muscular.

Eis um facto curioso: 90% da serotonina (o neurotransmissor do bem-estar) é produzida no intestino. Um intestino inflamado ou desequilibrado pode alterar a forma como sentimos dor — inclusivamente na lombar.

Inflamação silenciosa: a ponte entre o intestino e a dor

Quando o intestino está “em guerra”, o corpo inteiro sente-o. Alimentação pobre, antibióticos, álcool em excesso, stress crónico… tudo isto pode levar a um desequilíbrio da microbiota intestinal, o conjunto de bactérias que vivem no nosso intestino.

Este desequilíbrio provoca um estado chamado de inflamação crónica de baixo grau. É uma inflamação silenciosa, mas persistente, que afeta as articulações, os músculos e até os discos intervertebrais. Estudos mostram que esta inflamação sistémica aumenta a sensibilidade à dor — ou seja, sentimos mais dor, mesmo quando o estímulo é pequeno. Isto pode explicar por que algumas pessoas têm dores lombares mesmo sem nenhuma lesão grave.

SIBO, intestino irritável e dor nas costas

Condições como o SIBO (supercrescimento bacteriano no intestino delgado) ou a Síndrome do Intestino Irritável não afetam só o sistema digestivo. Há evidências de que muitas pessoas com estes problemas também relatam dor lombar crónica.

De que forma?

  1. Alterações no tónus muscular: A inflamação intestinal pode interferir no sistema nervoso autónomo e no controlo neuromuscular da zona lombar;

  2. Dor referida: O cérebro pode interpretar dores viscerais (dos órgãos internos) como dores somáticas (dos músculos e articulações), gerando dor lombar sem causa estrutural aparente;

  3. Inflamação dos discos intervertebrais: A inflamação crónica pode afetar diretamente os discos, contribuindo para a degeneração precoce e dor;

Alimentação e dor: o que entra, reflete-se no corpo

Vamos a um exemplo prático: já sentiste mais dor depois de um fim de semana de exageros alimentares? Ou menos dor depois de uma semana a comer “limpo”? Isso não é coincidência.

Alimentos ultraprocessados, ricos em açúcar, gordura saturada, farinhas refinadas e aditivos alimentares favorecem a inflamação e desequilibram a flora intestinal. Por outro lado, alimentos ricos em fibras, polifenóis e gorduras saudáveis (como azeite, nozes e peixes gordos) favorecem uma microbiota saudável — e, como consequência, reduzem a inflamação e a dor.

Exemplos de alimentos anti-inflamatórios para a lombar via intestino:

  • Vegetais de folha escura (espinafre, couve);

  • Frutas vermelhas (mirtilos, morangos);

  • Curcuma com pimenta preta;

  • Chá verde;

  • Iogurte natural com probióticos;

  • Alho e cebola;

E o papel do stress?

O stress emocional afeta diretamente a motilidade intestinal (capacidade do intestino em realizar movimentos musculares para mover e processar o bolo alimentar ao longo do trato gastrointestinal), a digestão e a saúde da microbiota. Um intestino sob stress gera inflamação, e a inflamação amplifica a dor — criando um ciclo vicioso. Além disso, o stress aumenta a tensão muscular, especialmente na zona lombar.

Por isso, abordagens que unem atividade física, gestão do stress e alimentação saudável têm mostrado ser mais eficazes para tratar a dor lombar crónica do que tratamentos isolados.

Movimento e microbiota: a dupla maravilha

O exercício físico moderado é um dos grandes aliados da saúde intestinal. Ele estimula o trânsito intestinal, reduz o stress e até modula positivamente a microbiota.

Por outro lado, o excesso de treino (overtraining), especialmente sem recuperação adequada, pode ter o efeito oposto: aumenta a permeabilidade intestinal (“intestino permeável”), facilita a inflamação e agrava as dores.

Por isso, o equilíbrio é a palavra-chave: treinar com inteligência, comer com consciência e recuperar com qualidade.

O que podes fazer na prática?

Se sofres de dor lombar crónica e já trataste os fatores mais óbvios — postura, força muscular, ergonomia — talvez seja hora de olhar para dentro. Literalmente.

Aqui vão 7 ações práticas que podes começar já hoje:

  1. Elimina alimentos processados durante 10 dias e observa se a dor melhora;

  2. Inclui alimentos fermentados naturais, como iogurte, kefir ou kombucha;

  3. Aposta nas fibras: aveia, leguminosas, sementes e vegetais;

  4. Evita o álcool e açúcar em excesso durante algumas semanas;

  5. Faz atividade física regular e com foco na mobilidade e no core;

  6. Reduz o stress com práticas como respiração diafragmática, meditação ou caminhadas conscientes;

  7. Consulta um nutricionista funcional ou médico integrativo, se a dor persistir;

A lombar saudável começa no intestino?

Talvez não comece lá, mas é certo que o intestino pode ser um grande aliado ou um grande sabotador da tua saúde lombar. A dor crónica raramente tem uma causa única — ela é o reflexo de vários sistemas em desequilíbrio.

Cuidar da tua microbiota intestinal é mais um passo, talvez inesperado, na tua jornada de reabilitação. E agora que sabes desta ligação, tens mais uma ferramenta poderosa para lutar contra a dor lombar de forma inteligente e integrada.

Porque o corpo não é um conjunto de peças soltas — é um sistema. E tudo está ligado.